ESPECIAL PARA A FOLHA
Bruno Padovano, idealizador desta edição da Bienal de Arquitetura, sonhava com uma mostra para todos os públicos. Falou até em crianças. Em parte, ele alcançou o feito: tem espaço de sobra para as crianças correrem. A exposição está rarefeita. Faltou conteúdo e curadoria: 60 dias antes da abertura, após declarar nesta Folha que nas edições anteriores "os espaços ficavam às moscas", ele foi afastado.
Sem repetir tendências, o vazio não é privilégio de nenhum andar. O visitante vai encontrá-lo já na entrada, nos estandes de empresas e livrarias. Pela primeira vez, uma empresa especializada comercializou os estandes. Nada contra, se não fosse o fato de conseguirem alugar só 1/5 do disponível. Um pouco acima, no térreo alto, o vazio continua nos ambientes governamentais. É espaço pago e sem conteúdo advindo da curadoria. Na sequência, o próximo piso é dividido pela mostra geral de arquitetos e pelas exposições dos países. Nos dois casos, há sobras e nada da curadoria. Na exposição geral, após pagar, os arquitetos apresentam o que bem entender (apenas vergonhas são barradas).
Os países também pagam, mas possuem curadores próprios que salvam a exposição. Efetivamente, só é possível ver a mão de Padovano no último piso, dividido entre estádios da Copa de 2014 e aquários para workshops estudantis (talvez o único ponto memorável do evento). Para finalizar o roteiro, a última parada é um estande de uma multinacional com 500 m2. "Entrou no final para fechar as contas", conta Mario Yoshinaga, vice-presidente da seção paulista do IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil).
O clima é de feira, não de mostra cultural. Um recurso cenográfico desta edição ajuda a diminuir a impressão de vazio generalizado: como se fosse fruto de uma fogueira colorida, nuvens de tecidos com quatro cores identificam cada andar e distraem a atenção do visitante para o teto.
O vazio expressa o pecado original da bienal: ela é de responsabilidade do IAB-SP. Se no passado o instituto foi fundamental para consolidar a profissão no Brasil, hoje sua importância é quase nula. O que sobra é a Bienal -sua vedete. Mas pesa sobre os ombros da maior mostra de arquitetura do país o caráter burocrático do instituto.
Sob esta ótica, há um forte agravante nesta edição: uma disputa política rachou os profissionais do IAB-SP. A diretoria responsável por esta Bienal assumiu a gestão com a ajuda de um chaveiro que arrombou a porta. À sua frente, estava o respeitado Joaquim Guedes. Tão brilhante quanto atormentado, Guedes licenciou-se do cargo para tentar uma vaga de vereador. Antes do pleito, morreu tragicamente atropelado em frente de casa e deixou como herança uma diretoria inexpressiva. A presidente, por exemplo, é Rosana Ferrari, cujo trabalho profissional mais significativo foi o ambiente "Grill Gourmet" em um mostra de decoração de Jundiaí.
A Bienal poderia salvar sua inócua gestão, e o plano incluía Padovano, eleito curador cinco meses antes da abertura do evento. Ele falou em sustentabilidade, errou ao não montar salas especiais para "democratizar" o evento e sua única ideia levada a cabo foi expor os estádios. Um tiro no pé: políticos e empreiteiras escolheram os arquitetos das arenas sem concursos, ou seja, diferente da forma democrática proclamada pelo IAB. Para viabilizar o evento, chegaram a pedir ajuda financeira das cidades-sede. Ora, é conteúdo ou propaganda?
Resumo da ópera: esta é a mais fraca entre todas as bienais já realizadas. Pensando nisso, antes de terminar a visita, fui hipnotizado pelas nuvens coloridas. Elas me pareceram o fantasma colorido de Joaquim Guedes pairando sobre a mostra.
Fernando Serapião é arquiteto e editor-executivo da revista "Projeto Design"
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
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