quarta-feira, 4 de junho de 2008

Poeira à vista no Complexo Industrial Portuário do Pecém ³


Outro entrave que deveria ter brecado a permissão para o início das obras da usina diz respeito à visão macro econômica do projeto. De acordo com Tozzi, é preciso inserir a planta no contexto da geração de energia nacional, já que o Estado delega funções próprias para o setor privado. “Um exemplo disso é a geração e distribuição de energia elétrica. Para que esses projetos sejam atrativos para o empreendedor, é necessário que haja uma permissão dos órgãos responsáveis para instalar usinas de baixo custo e retorno rápido, como é o caso de uma termoelétrica”, diz.


O carvão, que será importado da Colômbia pela MPX para sua termoelétrica de Pecém, é o mais barato do mundo. O próprio site da empresa de Eike Batista mostra que uma tonelada de carvão colombiano custa em torno de 24 dólares. Hoje, o barril de petróleo já ultrapassou a casa dos 120 dólares. Com custo baixo, prazo de obras que variam de 36 a 48 meses e pequena necessidade de funcionários (80, nesta usina em questão), a alternativa é um prato cheio para empresários e uma tragédia para o meio ambiente.


Exatamente o que diz um trecho do próprio EIA do empreendimento, citado na ação civil pública redigida pela Defensoria Pública do estado do Ceará: “a MPX Mineração e Energia Ltda. buscou a construção de uma usina termelétrica de baixo custo de instalação que pode ser instalada rapidamente”.


Além dos potenciais danos aos ecossistemas da região de São Gonçalo do Amarante, a termoelétrica ganha em proporção ao se juntar com as outras fábricas do Complexo Industrial Portuário de Pecém. Até agora, além do porto, há uma termoelétrica da empresa Endesa pronta e movida a gás natural momentaneamente parada, uma filial da firma de energia eólica Wobben, um gasoduto semi-finalizado, uma empresa de ração em construção e o terreno desmatado de uma siderúrgica que ainda não aportou em terras cearenses. Fora isso, são esperadas outras usinas movidas a carvão, uma refinaria e diversas indústrias de base.


Preocupado com esta transformação de uma área repleta de dunas e potencial eco-turístico em um grande complexo industrial, o Banco Mundial enviou recursos para o governo estadual há cerca de dez anos com um pedido: pensar em alternativas para descentralizar o impacto do complexo. Foi quando entrou em ação o arquiteto José Sales, que conversou com a reportagem de O Eco em seu escritório em Fortaleza e contou sobre sua participação no Plano de Estruturação Regional da Área de Influência do CIPP. O complexo havia sido concebido como porto e distritos industriais, esquecendo das conseqüências sobre o entorno, já que esta área tem grande fragilidade ambiental por ser uma planície litorânea e um cordão de dunas móveis e fixas”, explica.
O trabalho visava, justamente, mitigar os potenciais impactos ambientais do local. “Da nossa parte insistimos que o macro-risco era o "Efeito Cubatão": a concentração de matrizes industriais seria de tal monta que levaria a ações em cadeia não controláveis, na medida em que a avaliação de um empreendimento era analisada por si só e não "in totum" ou conjunto deles: uma "salada industrial" em uma area de expansão do turismo litorâneo, com investimentos internacionais, à epoca em negociação e hoje já compromissado”, comenta Sales.
A recomendação para solucionar o imbróglio foi simples: desconcentrar as plantas e criar um cordão ambiental de proteção do entorno, como mostra o mapa ao lado. Uma década depois, a Semace licenciou a termoelétrica da MPX sobre uma bacia hidrográfica que deveria ser protegida. “O órgão ambiental ignorou totalmente as nossas observações em contrário”, diz o arquiteto. Além de estudar somente esta usina, o EIA-Rima sugere a construção de uma piscina de algas para seqüestrar os gases estufas emitidos. Algo irrisório se comprado ao prejuízo ambiental. “Precisaria de um tanque do tamanho do Ceará para neutralizar a emissão de carbono”, finaliza Tozzi.

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