domingo, 29 de março de 2009

Aristides de Arruda Camargo: de São Paulo para o Cariri


O arquivista Aristides de Arruda Camargo, natural de São Paulo, se mudou para Farias Brito e fez históriaFarias Brito.


“Os homens criam raízes, como as árvores”. Sem essas raízes, que os ligam a terra, à cidade, a casa onde moram, eles se sentem perdidos. Foi o que ocorreu com o arquivista Aristides de Arruda Camargo. Neto de um médico oftalmologista, partícipe da Revolução Constitucionalista de 1932, e de uma imigrante alemã e filho de um médico ortopedista e uma escritora e botânica, Aristides tinha tudo para viver no conforto e na bonança da capital paulista.Trabalhou na Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, fez parte da equipe que investigou a vida dos presos políticos, na época da anistia, entre os quais, Júlio Prestes. Comprou um apartamento em São Paulo, viveu intensamente todas as emoções de uma cidade grande, como integrante de uma família de classe média.

Mas São Paulo, segundo sua definição, tornou-se uma senhora com 450 anos de idade que, ao tentar abraçar seus filhos termina sufocando-os. Os paulistanos não conhecem seus vizinhos e não sabem quem plantou a árvore que cresce na rua, em frente, ou quem a arrancou. Correm, lutam pela vida, têm bronquite.Enquanto acende um cigarro forte, feito à mão, Aristides reclama da poluição, da falta de saneamento, do barulho infernal, do espaço reduzido para suas crianças, das ruas cheias de valas, de larvas. “As cidades grandes foram desumanizadas. As pessoas estão sempre de passagem, não conhecem seus vizinhos, espremem-se em apartamentos, têm suas vidas controladas pelo síndico”, critica o arquivista.

Amores e desamores nasceram e morreram em meio à avalanche de aventuras e desilusões. A síndrome da cidade grande levou Aristides à depressão, a estafa, cansaço mental e, consequentemente, ao consumo de medicamentos controlados. Um psicólogo primo dele recomendou a suspensão de todos os remédios e prescreveu a música como meio de Aristides se encontrar consigo mesmo.


Hoje, com 56 anos, o arquivista Aristides de Arruda Camargo é a enciclopédia da cidade. Sabe tudo sobre Farias Brito e o Cariri, a começar pela mudança do nome da cidade que antes era conhecida como Quixará. Como existia muitas cidades no Ceará iniciada com o mesmo prefixo, Quixadá, Quixeramobim e Quixilô, o nome foi mudado para Farias Brito, numa homenagem ao grande filósofo cearense de São Benedito.


A mudança do nome está relacionada com a maldição de um antigo vigário da cidade que teria afirmado: “esta vila nunca passará de Quixará”. Entre os documentos colecionados por Aristides, estão inventários, ordens de pistolagens e contribuições que o povo de Quixará deu para a construção de um navio na Segunda Guerra Mundial.


Preocupado com as pilhas de documentos oficiais, o homem de caminhar trôpego e linguagem alvoroçada, depressa organizou o projeto de lei que criou o Arquivo Público da cidade de Farias Brito. Em seguida, o suposto louco assumiu, por mérito próprio, a direção da entidade e se fez necessário aos servidores e aposentados que lhe procuravam.


Para o filho de Farias Brito, Elmano Rodrigues, que trabalha na parte editorial da Universidade Federal de Brasília, Aristides deu uma grande contribuição para a história do Cariri. Deu o maior exemplo de dignidade. Elmano afirma que “só um possuído por acesso de loucura, largaria uma confortável vida na principal urbe do sul do País, para resgatar bens culturais de um torrão tão estranho, que mal se sabe ao que o levou a tantos desafios”.
Reportagem e fotografia de Antonio Vicelmo para o caderno Regional do Diário do Nordeste. Reprodução unicamente para divulgação. Direitos autorais reservados.

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